Pode ser difícil ver como Adão e Eva caindo no pecado poderia trazer glória a Deus. Na verdade, alguns podem até se perguntar por que, se Deus já sabia com antecedência todos os problemas que causariam, Ele os criou em primeiro lugar.
Deus é onisciente (Salmo 139:1-6), e conhece o futuro (Isaías 46:10). Então Ele definitivamente sabia que Adão e Eva pecariam. No entanto, Ele os criou mesmo assim e deu-lhes um livre-arbítrio com o qual escolheram pecar.
Devemos observar cuidadosamente que Adão e Eva pecando não significa que Deus seja o autor do pecado ou que Ele tentou-os a pecar (Tiago 1:13). No entanto, a queda faz parte do plano geral de Deus para a criação e a humanidade.
Se considerarmos o que alguns teólogos chamam de "meta-narrativa" (ou história abrangente) das Escrituras, vemos que a história bíblica pode ser vagamente dividida em três seções principais: 1) o paraíso (Gênesis 1-2); 2) o paraíso perdido (Gênesis 3 - Revelação 20); e 3) o paraíso recuperado (Apocalipse 21-22). De longe, a maior parte da narrativa é dedicada à transição do paraíso perdido ao paraíso recuperado. No centro desta meta-narrativa está a cruz, que foi planejada desde o início (Atos 2:23).
Ao ler as Escrituras cuidadosamente, somos levados às seguintes conclusões:
1. Deus já sabia de antemão que a humanidade cairia em pecado.
2. A crucificação de Cristo, necessária para a expiação dos eleitos de Deus, foi predestinada por Deus.
3. Todas as pessoas glorificarão a Deus um dia (Salmo 86:9), e Deus propõe "fazer convergir nele, na dispensação da plenitude dos tempos, todas as coisas, tanto as do céu como as da terra" (Efésios 1:10).
O propósito de Deus era criar um mundo em que Sua glória pudesse se manifestar em toda sua plenitude. A glória de Deus é o principal objetivo da criação. Na verdade, é o objetivo geral de tudo o que Ele faz. O universo foi criado para mostrar a glória de Deus (Salmo 19:1), e a Sua ira é revelada contra aqueles que não O glorificam (Romanos 1:18-25). O mundo que melhor mostra a glória de Deus é o mundo que temos - um mundo que foi autorizado a cair, um mundo que foi redimido, e um mundo que será restaurado à sua perfeição original.
A ira e a misericórdia de Deus mostram as riquezas da Sua glória, mas não poderíamos ver nenhuma das duas sem a queda da humanidade. Nunca conheceríamos a graça se nunca tivéssemos necessitado dela. Portanto, todo o plano de Deus - incluindo a queda, a eleição, a redenção e a expiação da humanidade - serve o propósito de glorificar a Deus. Quando o homem caiu no pecado, a misericórdia de Deus foi imediatamente exibida quando Ele não o matou imediatamente. A graça de Deus foi imediatamente evidente na cobertura que Ele forneceu para a sua vergonha (Gênesis 3:21). A paciência e a longanimidade de Deus foram exibidas depois, quando a humanidade caiu mais e mais profundamente no pecado. A justiça e a ira de Deus estavam em exibição quando Ele enviou o dilúvio, e a Sua misericórdia e graça foram novamente demonstradas quando Ele salvou Noé e sua família. A santa ira e a justiça perfeita de Deus serão vistas no futuro, quando Ele lidar com Satanás de uma vez por todas (Apocalipse 20:7-10).
A glória de Deus também é revelada em Seu amor (1 João 4:16). Nosso conhecimento do amor de Deus vem da Pessoa e da obra salvadora de Jesus Cristo neste mundo caído. "Nisto se manifestou o amor de Deus em nós: em haver Deus enviado o seu Filho unigênito ao mundo, para vivermos por meio dele" (1 João 4:9). Se Deus tivesse decidido não criar Adão e Eva, com base no conhecimento de sua queda - ou se Ele os fizesse autômatos sem nenhuma vontade - nunca saberíamos verdadeiramente o que é o amor.
A exposição final da glória de Deus foi na cruz onde a Sua ira, justiça e misericórdia se encontraram. O juízo justo de todo pecado foi executado na cruz, e a graça de Deus foi novamente exposta nas palavras de Seu Filho: "Pai, perdoa-lhes" (Lucas 23:34). O amor e a graça de Deus são manifestos nos que Ele salvou (João 3:16; Efésios 2:8-10). No final, Deus será glorificado quando o Seu povo escolhido o adorar por toda a eternidade com os anjos, e os ímpios também glorificarão a Deus, pois a Sua justiça resulta no castigo eterno dos pecadores não arrependidos (Filipenses 2:11). Sem a queda de Adão e Eva, nunca conheceríamos a justiça, a graça, a misericórdia ou o amor de Deus.
Alguns levantam a objeção de que a presciência e preordenação da queda por parte de Deus danificam a liberdade do homem. Em outras palavras, se Deus criou a humanidade com pleno conhecimento da iminente queda no pecado, como o homem pode ser o responsável? A melhor resposta a essa pergunta pode ser encontrada na Confissão de Fé de Westminster:
“Desde toda a eternidade, Deus, pelo muito sábio e santo conselho da sua própria vontade, ordenou livre e inalteravelmente tudo quanto acontece, porém de modo que nem Deus é o autor do pecado, nem violentada é a vontade da criatura, nem é tirada a liberdade ou contingência das causas secundárias, antes estabelecidas.” (WFC, III.1)
Em outras palavras, Deus ordena os eventos futuros de tal forma que nossa liberdade e o trabalho de causas secundárias (por exemplo, leis da natureza) sejam preservados. Os teólogos chamam isso de "concorrência". A vontade soberana de Deus flui simultaneamente com nossas escolhas livres de tal forma que nossas escolhas livres sempre resultam na realização da vontade de Deus (por "livres", estamos nos referindo às escolhas que não são coagidas por influências externas). É uma interação complexa de vontades e escolhas, mas o Deus Criador pode lidar com qualquer quantidade de complexidade.
Deus previu a queda de Adão e Eva. Ele os criou mesmo assim, à Sua própria imagem, para trazer glória a Si. Eles receberam liberdade para fazer escolhas. Apesar de terem escolhido desobedecer, a sua escolha se tornou o meio pelo qual a vontade suprema de Deus foi realizada e pela qual a Sua plena glória será vista.
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